Ciúmes: Paranoia ou Prova de Amor? 

Aprendemos desde cedo a sermos ciumentos nas relações amorosas. A criança tem ciúme da mãe, porque se a mãe desaparecer, ela morre. É uma questão de sobrevivência. Quando adultos, ao entrarmos em uma relação amorosa, a dependência infantil reaparece com bastante força. Na pessoa amada é depositada a certeza de ser cuidado e de não ficar só. A distância faz sentir o desamparo da mesma forma que sentia quando a mãe se ausentava. 

A dependência emocional que se estabelece, torna comum depositar no outro a garantia de não ficar só. O medo da solidão e do desamparo leva à exigência de que a pessoa amada não tenha olhos para mais ninguém. E ambos se iludem acreditando que se completam. Mas ninguém completa ninguém! Sem que percebamos, inconscientemente, é comum reeditarmos nossas necessidades infantis na pessoa amada. Costumo dizer, que essa história de metade da laranja, só existe na música do cantor Fábio Júnior. Se fosse verdade, por que até hoje ele não encontrou a metade dele? 

Acredito que essa dependência, foi reforçada desde que o amor romântico foi introduzido na nossa cultura no início do século XX. E através de filmes, novelas e músicas aprendemos que um pouco de ciúmes faz bem. Que um pouco até ajuda a apimentar a relação. E que se o seu par não sente ciúmes é porque ele não te ama. Só que não! 
Ciúmes NÃO É e nem NUNCA será PROVA de AMOR! 

As características do amor romântico são bem claras: você idealiza a pessoa amada e projeta nela tudo o que gostaria que ela fosse. Você não se relaciona com a pessoa real, mas a inventada na sua cabeça de acordo com as suas próprias necessidades. A partir daí que começa a existir o medo de perder a pessoa amada, afinal você naturalmente passa a se doar e fazer de tudo por ela, porque você acredita que ela também tem que fazer de tudo por você. Você atribui todas as suas expectativas e necessidades nas mãos do outro. 

Se ambos pensam assim nasce aí uma relação codependente. E nas relações codependentes cada parceiro busca no outro o que lhe falta. Essa relação codependente sempre se estabelece nas custas de um dos parceiros ou de ambos. A dependência emocional gera ansiedade porque é comum alimentar a ideia de que a pessoa que amamos tem poder sobre nós – poder de nos amar, mas também de nos abandonar. Daí vem o medo de críticas, rejeição, de ouvir um NÃO na cama, de ser abandonado etc.  

Muitos acreditam até que a pessoa amada deve estar sempre pronta para suprir todas as suas necessidades, adivinhando pensamentos e desejos. A crença de que existe alguém de quem dependemos para sermos felizes, só alimenta mais ainda o pavor de perdê-lo. Assim o desejo de posse se manifesta. E por acreditar que o ciúme faz parte do amor, aceitam-se os mais variados tipos de violência, atitudes que não correspondem ao amor, e sim uma demonstração de desrespeito à liberdade do outro. 

O ciúme é uma construção elaborada por quem está sentindo e depende pouco da ação do outro. Quase todos nós produzimos essas situações, e se permitirmos que uma construção fantasiosa da realidade nos faça mal, então, precisamos de ajuda. Como patologia, o ciúme já foi classificado como “paranoia” ou “transtorno paranoide”, porém como os delírios não são necessariamente sempre de natureza persecutória, hoje esse termo já está inadequado. Portanto, hoje se classifica como transtorno delirante, ou seja, algo imaginário, sem controle e acompanhado de um desejo obsessivo de controle total sobre os sentimentos e comportamentos do outro, que tem como base características muito claras: insegurança, baixa autoestima, dependência emocional e o medo de ficar sozinho.  
 
O ciúme, portanto, sempre será algo limitador para quem sente e para quem é alvo dele. E como na nossa cultura acredita-se que a relação amorosa é a única maneira de amenizar o desamparo, a pessoa amada se torna imprescindível, alimentando mais ainda a ansiedade e o medo de perdê-la. 

Não tem jeito: é necessário ter clareza do que se deseja numa vida a dois e buscar acima de tudo ter vida própria, cuidar da autoestima e autoconfiança. 

Precisamos entender que o AMOR se baseia em dois pilares: ENTREGA e AUTONOMIA. Ao mesmo tempo que temos necessidade de união, também temos necessidade de distanciamento. Com excesso de distância, não pode haver VÍNCULO. Mas o EXCESSO de união elimina a INDEPENDÊNCIA. Então, não há ninguém mais a descobrir. Não há nenhum outro mundo interno onde entrar. Quando as pessoas se fundem, quando dois viram um, não há com quem estabelecer uma ligação. Assim, o DISTANCIAMENTO é uma precondição da LIGAÇÃO: este é o paradoxo essencial das RELAÇÕES. 

Buscar esse equilíbrio e entender que a relação é feita de três: VOCÊ, O OUTRO e OS DOIS, faz com que você não exija que o outro supra suas necessidades, mas que partilhem os momentos a dois, ou seja, daquilo que ambos têm em comum. Acredito que a melhor maneira de ser feliz a dois é aprender a ser feliz sozinho. Assim, a companhia será uma questão de escolha e não necessidade. 

Portanto, que encontremos o equilíbrio entre a individualidade e o individualismo. Assim passaremos a olhar não somente para o próprio umbigo, mas que sejamos capazes de respeitar a individualidade e privacidade do outro, sem controle, sem posse e sem cobranças. Não acredite que esse sentimento de posse seja algo natural ou que tenha relação com amor. O amor liberta, jamais prende! 

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